Modalidade Basic Funding Alliance (BFA) destina recursos não reembolsáveis ao cofinanciamento de projetos de pesquisa e desenvolvimento (P&D)
A Embrapii (Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial), ligada ao Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) do governo federal, está investindo em um projeto pesquisa no Brasil que busca desenvolver a cadeia de suprimentos para viabilizar novas fontes de ingredientes alternativos destinados à produção de proteína cultivada. O aporte total para a pesquisa é de R$ 6,5 milhões, financiado por meio da modalidade Basic Funding Alliance (BFA), que destina recursos não reembolsáveis ao cofinanciamento de projetos de pesquisa e desenvolvimento (P&D) com baixo nível de maturidade tecnológica.
A pesquisa, iniciada no final de 2023, tem duração de dois anos, e conta com a participação de distintos Institutos SENAI de Inovação, que são Unidades Embrapii. O projeto também envolve a JBS Biotech, centro de inovação em biotecnologia avançada da JBS, e Duas Rodas, empresa que tem expertise na extração de bioativos de produtos naturais usados na indústria alimentícia, além das startups BiomeHub, em Florianópolis (SC) e AlgaSul, em Rio Grande (RS).
Frentes diversas
Em 2019, a Organização das Nações Unidas (ONU) divulgou um relatório pedindo mudanças na forma como o mundo produz e consome alimentos. O documento estima que, até a década de 2050, a população mundial deverá atingir cerca de 10 bilhões de pessoas. Por este motivo, é crucial promover mudanças no sistema global de alimentos, visando garantir comida adequada para todos e reduzir impactos ambientais.
As pesquisas para a produção de proteína cultivada apresentam alguns desafios, entre eles a substituição dos componentes do soro fetal bovino e a busca por ingredientes de origem não animal, que atendam a critérios de sustentabilidade e que apresentem características sensoriais similares à carne convencional.
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Leonardo Oliveira, Gerente de Operações do ISI-SE, diz que o foco do projeto apoiado pela Embrapii é identificar e testar fontes de ingredientes alternativos e que sejam ao mesmo tempo sustentáveis e economicamente viáveis. Ele explica que durante o período de dois anos, o material coletado será integrado em uma plataforma que usará Inteligência Artificial (IA) para otimizar a análise de dados e a tomada de decisões. Leonardo ressalta a importância do apoio da Embrapii, já que em projetos de pesquisa em estágios iniciais há riscos tecnológicos maiores e menos disposição de grandes empresas de investir nesse tipo de empreitada. Neste caso, a Embrapii é responsável por 90% dos investimentos e as empresas JBS e Duas Rodas, em conjunto, financiam os outros 10%.
Fernanda Berti, Diretora Executiva do JBS Biotech Innovation Center, afirma que a empresa vem investindo no mercado de proteína cultivada desde 2022, como forma de conseguir desenvolver nova vertente de produção de alimentos para suprir a demanda global da atualidade.
“Esse tipo de tecnologia não vem para competir com os modelos convencionais de produção de carne, mas serve como um caminho alternativo pensando sobretudo na segurança alimentar”, destaca Berti, que enxerga um cenário promissor no projeto, em que há uma equipe multidisciplinar dedicada à pesquisa de inovação disruptiva.
A executiva explica que oportunidades como essa, em que instituições de pesquisa, empresas e startups trabalham conjuntamente, “permitem explorar possibilidades tanto na pesquisa básica, quanto na aplicada, e pensar em soluções que mobilizem o ecossistema de pesquisa e inovação do país”. ”O fomento oferecido por meio de editais da Embrapii possibilita que as empresas se voltem para pesquisas, o que pode ter impacto futuro no mercado e na neoindustrialização, com a oferta de produtos inovadores e que atendam às necessidades da população”, conclui Berti.
Salvelino Nunes, gerente de pesquisa e tecnologia avançada com foco em inovações estratégicas da Duas Rodas, também vê o diálogo e a troca de conhecimentos com centros de pesquisa e inovação, startups e outras companhias como uma grande vantagem do projeto. No caso da pesquisa apoiada pela Embrapii, a empresa se volta a analisar fatores sensoriais, como sabor e textura, durante a investigação de ingredientes alternativos para produzir carne cultivada.
A pesquisadora e gestora técnico-científica do projeto, Karine Lena Meneghetti, vinculada ao ISI-SE, explica que 31 profissionais estão envolvidos no estudo, entre gestores e pesquisadores de áreas diversas como engenharia química, biomedicina, engenharia ambiental, biologia, engenharia de alimentos, ciências da computação, bioinformática, entre outros. Um dos diferenciais da pesquisa é o uso de ciências ômicas, que não costumam ser exploradas na indústria de alimentos, segundo Karine. Elas oferecem a possibilidade de estudar meios biológicos de maneira mais integrada, podendo resultar em tecnologias inovadoras e robustas para a pesquisa de novos ingredientes. Pensando em cenários futuros, a pesquisadora acredita que até 2030 seja viável, do ponto de vista científico, desenvolver ingredientes alternativos para a produção de carne cultivada, buscando soluções em fontes vegetais e microbianas. Mas ela lembra que é preciso observar algumas questões importantes nesse cenário, como legislação adequada e fomento contínuo para pesquisas.
Ao final dos dois anos do projeto, a expectativa é que sejam desenvolvidas ferramentas para análise de dados, que utilizam tecnologias de sequenciamento genético, análises químicas, celulares, moleculares, de bioinformática e de inteligência artificial. Esta compilação de dados irá permitir identificar, entre outras coisas, potenciais ingredientes alternativos para a cadeia de produção de carne cultivada.