O nosso jeito de se alimentar e os produtos que consumiremos será totalmente diferente no futuro. É assim que Paulo Silveira enxerga o mercado de alimentos no mundo.
Paulo é CEO e fundador do FoodTech Hub Latam, ecossistema de inovação em alimentos na América Latina, com foco em inovação aberta e investimento em FoodTechs, além de membro do conselho de administração de diversas empresas no Brasil e América Latina.
Nesta entrevista, ele nos conta um pouco sobre os desafios do mercado de produção de alimentos, as transformações que os setor passa e que deverão se intensificar nos próximos anos e também fala da importância da educação para combater a deseinformação a respeito dos novos alimentos.
Confira abaixo a conversa na íntegra:
FTHNews: Qual é o desafio da produção da alimentos no Brasil atualmente?
Paulo Silveira: Principal desafio da indústria de alimentos hoje é produzir produtos saudáveis, nutritivos e acessíveis a toda população. O Brasil, apesar de ser um potencia agrícola, mais de 30 MM de pessoas no Brasil sofrem de insegurança alimentar profunda e mais de 60 MM de algum tipo de insegurança alimentar. Fazer chegar à mesa da população produtos mais Biofortificados, mais proteínas, mais vitaminas é um desafio que temos que superar rapidamente.
FTHNews: Qual é a transformação que veremos acontecer na indústria de alimentos nos próximos anos?
Paulo Silveira: Todo o ecossistema agroindustrial passará por uma transformação, seja por uma indústria mais verde e sustentável, seja pela transformação digital. Mas a maior transformação que permeia todas as outras é a transformação de modelos de indústria setorial para o modelo de economia de ecossistema.
FTHNews: Estamos falando de quais tipos de alimentos?
Paulo Silveira: Acredito que iremos nos deparar com funcionalidades de produtos que atualmente estão sendo produzidos de maneira tradicional, para funcionalidades análogas produzidos por rotas mais eficientes e sustentáveis. Como por exemplo a rota de biotecnologia.
“a maior transformação que permeia todas as outras é a transformação de modelos de indústria setorial para o modelo de economia de ecossistema”
FTHNews: Como é trabalhar em ecossistema e por que esse modelo é tão necessário ao se olhar para o futuro?
Paulo Silveira: Trabalhar em ecossistema exige olhar de maneira holística e colaborativa para todos os atores que compõe uma determinada cadeia. Nesse modelo, os atores de um determinado ecossistema têm um valor adicionado muito maior do que atingiria individualmente. Definitivamente, o centro é os clientes
FTHNews: Qual é o papel das startups na transformação do mercado de alimentos?
Paulo Silveira: Fundamental. O Empreendedor é a grande alavanca dessa transformação. Novas ideias, novas soluções, novas tecnologias. O que precisamos no Brasil é uma estrutura, metodologia e funding para ajudar nossos empreendedores a entrar no mercado de maneira organizada.
FTHNews: Ao falar de alimentos, estamos falando de uma cadeia muito grande. Como a conexão com todos os setores é fundamental – da indústria de fertilizantes, do pequeno produtor, ao cozinheiro lá na ponta?
Paulo Silveira: De novo o conceito de ecossistema. Todos os atores interagindo de uma maneira que todos os elos se beneficiem. O pequeno produtor com suas próprias bio fábricas de bio fertilizantes, o pequeno industrial com sua fonte de matéria prima perto de sua fábrica, consumidor consumindo produtos de alta qualidade perto de sua comunidade. Um grande ganha-ganha.
FTHNews: Você atua bastante na articulação com muitas empresas, pesquisadores e autoridades da área. Hoje, qual é o nível de engajamento do setor neste processo de transformação dos alimentos? As grandes empresas já estão em nível avançado de investimentos em inovação?
Paulo Silveira: Desde que iniciei o FTH Latam vejo uma evolução. De novo, fomos treinados a “ficar no nosso quadrado” e quando o conceito de ecossistema vem para “quebrar” esses paradigmas, demora. Mas estou bem otimista. A indústria vai perceber que se não inovar, vai ficar para trás.
“Temos que encontrar novos métodos e modelos produtivos que sejam mais eficientes em produzir produtos de alto valor nutritivo.”
FTHNews: O mercado avança nas discussões da pauta ambiental. Ao mesmo tempo, há uma necessidade maior de alimentos para a população, o que demanda áreas e diversos impactos de produção, como por exemplo, a criação de gado. Como é possível equilibrar essa equação?
Paulo Silveira: Essa discussão para mim é importante, porque é nisso que vejo a transformação. Temos que encontrar novos métodos e modelos produtivos que sejam mais eficientes em produzir produtos de alto valor nutritivo. Mas aí vem uma discussão ideológica que atrapalha. A questão é técnica. Produzir mais, com menos, preservando o planeta.
FTHNews: Muito se fala em segurança alimentar. Por que é preciso olhar com atenção para essa questão?
Paulo Silveira: Simplesmente porque nos dias de hoje é inaceitável uma pessoa não ter garantido o mínimo de três refeições saudáveis por dia. Temos insegurança alimentar para alguns e obesidade para outros. É preciso repensar todo nosso modelo nutricional.
FTHNews: Os avanços no desenvolvimento de novos alimentos ainda esbarram em investimentos no Brasil?
Paulo Silveira: Não só. Esbarram também em regulatórios, burocracias, ideologias e outras coisas fora do principal foco que é alimentar a população. Acredito que a indústria investirá, se houver mercado e que os alimentos sejam seguros de forma a garantir a saúde da população. A indústria investe milhões anualmente em segurança dos alimentos, para evitar danos colaterais de saúde. Nos novos alimentos temos que passar por esse processo também.
“Cabe a todo o ecossistema ter a responsabilidade de comunicar certo. Mas para isso precisa investir e isso não estou vendo, infelizmente”
FTHNews: Atualmente já é possível encontrar muita inovação na área de alimentos nas gôndolas e freezers de supermercados. Como investir em educação do consumidor é importante para que realmente haja mais adesão ao novo?
Paulo Silveira: Esse é um ponto que devemos lutar. A comunicação com a sociedade está turva devido a grande quantidade de desinformação vindo das redes sociais. Cabe a todo o ecossistema ter a responsabilidade de comunicar certo. Mas para isso precisa investir e isso não estou vendo, infelizmente.
FTHNews: Você diz que no futuro o jeito de se alimentar será completamente diferente. Com a sua experiência, o quão longe você vê esse futuro? As pessoas vão se surpreender?
Paulo Silveira: O futuro está batendo na nossa porta. Nós é que não estamos ouvindo.
